hoje

beatriz
2 min readJan 18, 2023

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escrever como um desafio à mediocridade da burocracia que pinta de bege, preto e azul os nossos dias.

pensava que virei uma pessoa sem assunto, meio chata: falo de trabalho, família, de problema. surfando numa onda de “eu, eu, eu”, relato minuciosamente meus problemas às pessoas próximas, numa ansiedade de quem queria sair correndo deles. as demandas tem sido tão intensas, e nada parece refreá-las a ponto de permitir um suspiro. mas além disso, tenho vivido um apagamento: da cor, da música, da arte, da rua.

é preciso resistir fortemente às quarentas horas semanais se queremos nos manter conectados à arte. nostalgicamente, me lembro de sair da universidade de coração apertado por qualquer problema (até os graves), sentar no meio fio de uma rua, beber uma cerveja, faltar aula e ouvir histórias idiotas sobre pessoas que se pegaram na festa do fim de semana. banal, sim, mas leve. folha voando no fim de tarde numa praça, sabe? me lembro também de ir pra slam de poesia e viajar na vivências de cidade diferentes que se apresentavam nos poemas. me lembro de sentar na praça da catedral e olhar de baixo o cajueiro, de sentar à mesa com minhas amigas e pintar minhas emoções angustiadas numa folha de caderno. fazer colagens sentada na cama de mari e planejar visitas a museus. suspiros…

me disseram: ah, é isso. virar adulto é isso. foda-se, né? não é. se só temos esse tempo, o trabalho é se colocar contra o achatamento, impedir a mortificação do eu interessante e vivo que procura brecha na movimentação da vida.

ir à praia no intervalo do almoço, levar frutas pra nova amiga gata, vê-la tomando sol e o mar azul verdinho… escolher a vida e lutar por ela.

o estágio pós-sobrevivência é o encontro maluco entre equilíbrio e impulso, capturar a beleza da água-viva sem tocá-la.

queria dizer mais coisas mas ainda não sei por onde ir, porque acabei de chegar.

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