recife

beatriz
2 min readApr 19, 2022

ganhar ou perder uma cidade é um movimento de mergulho no abismo.

me joguei pra você de braços e coração abertos, com desejo, encanto, vontade e prazer. mas veio um vírus maldito e me roubou de ti os caminhos e as oportunidades de me enraizar em você. confesso que consegui, por umas frestas, te conhecer um pouco, te experimentar, mas o processo real de encostar meus pés nos seus foi impedido pela falta de circulação e entrega na vida cotidiana. mesmo quando tudo abriu, home office. mesmo quando tudo abriu, ainda não tinha festa, vida pulsando. quando fui embora, os tambores voltaram a tocar. e sinto que perdi muito mais do que uma cidade, porque perdi a mim mesma e os caminhos que poderia seguir.

fiquei trancada, te olhando de dentro como um bicho preso, confuso e sem entender, olhando as pessoas que pisavam em suas ruas com a propriedade de quem pertence a um lugar.

olhava com olhos assustados de quem não teve a chance de aprender a viver desse jeito.

fui embora muito cedo, e não sei se um dia volto pra ficar.

tenho me sentido um pouco winona ryder com meu novo corte de cabelo, e talvez um “garota, interrompida”, jogado assim mesmo sem contexto, explique mais ou menos como sinto que nossa relação aconteceu. foi assim: interrompida. sinto saudades de tudo que não vivi, dos lugares que não me apossei, das experiências que não pude ter, dos espaços que nunca visitei. sinto um luto imenso, principalmente, por quem eu poderia ter sido se nada disso tivesse nos interrompido.

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